Receita deve publicar portaria sobre nova regra para remessas

Receita deve publicar portaria sobre nova regra para remessas Receita deve publicar portaria sobre nova regra para remessas

Representantes do varejo, de plataformas estrangeiras e da Receita Federal se reuniram ontem para tentar avançar no debate do novo programa de remessas internacionais do governo. O Valor apurou que, pelo que foi discutido, uma portaria deve ser publicada pela Receita nos próximos dias sobre como será o processo de adesão às novas regras.

Ainda há, porém, uma série de dúvidas sobre o funcionamento do programa e da capacidade de fiscalização dos Correios e da Receita sobre as mercadorias importadas, após a chegada das remessas. Participaram da reunião virtual o subsecretário da Receita, Jackson Corbari, membros do IDV, principal entidade de empresas do varejo, e representantes de plataformas como Shein e Shopee, apurou o Valor.

Segundo portaria publicada na sexta-feira pelo Ministério da Fazenda, a partir de 1º de agosto envios internacionais de até US$ 50 serão isentos de imposto de importação de 60% se a plataforma on-line estiver dentro do novo programa. Na reunião foi informado que o transportador da remessa — Correios ou as empresas privadas de “courier” — farão a adesão ao novo programa, o Remessa Conforme, e as plataformas e seus lojistas farão o envio dos produtos por meio desses operadores habilitados. O envio pode ser feito dentro ou fora do Remessa Conforme.

São entre 800 mil e 1 milhão de encomendas enviadas diariamente ao país, logo, cada uma delas estará dentro ou fora desse novo sistema. Isso eleva o grau de complexidade da fiscalização, concordam sites estrangeiros e redes locais, pelos menos nos primeiros meses de implementação das regras.

Se a empresa enviar a compra pelo Remessa Conforme, o consumidor fica isento dos 60% de imposto de importação nos envios de até US$ 50, e o desembaraço das mercadorias será mais rápido. Haverá a incidência de 17% de ICMS sobre o valor total da compra (incluindo frete e seguro)

Caso o envio ocorra fora do Remessa Conforme , continuam a valer as regras em vigor hoje, com cobrança do imposto de 60%, além do ICMS de 17%.

Se o consumidor comprar algo numa plataforma que usa um transportador certificado, ela terá o “selo de conformidade”. Se não tiver o selo, a compra será transportada fora do novo sistema.

Muitos dos pontos levantados pelas plataformas e redes na reunião de ontem passavam por esses temas. “Ainda há dificuldade de entender os impactos e como o modelo funcionará. Teremos uma fase de transição pela frente. O fato é que teremos uma espécie de dois ‘corredores’ de produtos chegando ao país, um dentro e outro fora do programa”, disse uma pessoa que esteve na reunião.

Ainda ontem, ao ser questionada, a Receita disse que está “trabalhando” para se adequar ao novo formato e eventuais atrasos na implementação, se ocorrerem, não devem ser significativos, apurou o Valor. Há possibilidade de não haver adesão imediata ao programa, segundo a ABComm, entidade do comércio online.

O IDV deve se reunir com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entre esta semana e a próxima, para apresentar sugestões de alíquotas para se definir um novo imposto de importação nas remessas internacionais. Esse assunto já havia sido tratado em encontro entre Haddad e o IDV, no último sábado, e ficou acertado que o instituto faria análises e sugerir alíquotas que possam estabelecer isonomia tributária das redes com as plataformas estrangeiras.

O tema foi tratado depois de duas críticas que o setor varejista fez à forma como o governo conduziu a discussão sobre o tema do imposto nessas remessas. Como o Valor antecipou na sexta-feira, o tema da isenção nunca foi discutido com líderes do varejo, apesar dos encontros ocorridos, com o ministério e a presidência da República, neste mês, para tratar de mudanças nas regras.

Após a publicação da portaria, Haddad disse que haveria uma segunda fase do programa, com prováveis ajustes, e o varejo passou a defender a definição de uma nova alíquota. Segundo uma fonte, já há um entendimento entre varejistas que essa taxa não pode ficar abaixo de 25%, que é o imposto de importação de vestuário.

“A palavra hoje é isonomia, é garantir a isonomia tributária entre as redes e as plataformas. Estamos trabalhando para trazer a realidade dos impostos ao ministro, e a decisão cabe a ele. Não vamos definir nada, vamos apresentar as informações ao ministro e propostas para buscar uma equidade”, disse Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV. Ele não mencionou alíquotas possíveis.

Paralelo a esse movimento, o Valor apurou que o IDV vem ampliando a discussão sobre a isenção de imposto e o novo programa junto às indústrias. A ideia é trazer a Fiesp, a federação das indústrias de São Paulo, para esse debate, considerando o efeito da entrada de importados no país no setor produtivo, e não apenas no varejo.

O presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva, comanda a Coteminas. Na quinta-feira passada, um dia antes do anúncio da isenção dos 60%, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve com Gomes. Naquela tarde, a Shein e a Coteminas anunciaram acordo para produção de roupas da Shein em unidade da Coteminas em Natal (RN).

A Coteminas enfrenta situação financeira difícil. O acordo com a Shein envolve a entrada de recursos na Coteminas como capital de giro. Gomes é filho de José Alencar, vice-presidente na gestão do presidente Lula, de 2003 a 2010, e tem relação próxima com membros do atual governo. Procurada, a Fiesp não se pronunciou.

Matéria publicada no jornal Valor Econômico, 5/7/2023
Imagem: Pixabay

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