Flávio Rocha, da Riachuelo, vê ‘carnificina’ de empresas se isenção de imposto a estrangeiros perdurar

Flávio Rocha, da Riachuelo, vê ‘carnificina’ de empresas se isenção de imposto a estrangeiros perdurar

O empresário Flávio Rocha, presidente do conselho de administração da Guararapes, dona da Riachuelo, vê risco de “carnificina” no setor, com a decisão do governo de isentar as remessas internacionais do imposto de importação de 60%, em envios de até US$ 50.

Na sexta-feira, o Ministério da Fazenda publicou portaria sobre esse tema, e a isenção será válida após 1º de agosto, para plataformas de comércio on-line estrangeiras que aderirem a um novo programa (chamado “Remessa Conforme”) que define condições para essa importação.

Plataformas que não aderirem ao “Remessa” continuarão cobrando do consumidor o imposto de 60% sobre a compra, além de ICMS de 17%.

Rocha entende que o “Remessa Conforme” tem pontos positivos, mas a decisão de isentar as plataformas foi errada.

“Todos os países estão seguindo outro caminho, recorrendo a medidas antitruste, e a gente está escancarando ainda mais, seguindo um caminho de exportar empregos em massa, o caminho do antiprotecionismo, de concedermos benefícios para favorecer o emprego na China”, disse.

“Temos que buscar uma isonomia tributária no setor. Se não tiver equidade vai ser uma carnificina maior que aquelas que tivemos décadas atrás. Nós tivemos uma invasão de importados nos 90 com duro efeito sobre a indústria brasileira, especialmente a têxtil, e agora você tem uma repetição desse mesmo processo, mas num ambiente de um varejo muito mais globalizado e com o setor tendo que lidar com muito mais desafios”.

Rocha é membro do IDV, instituto do varejo, que vem liderando esse debate pelo setor.

O empresário vê risco de desindustrialização no país, num momento em que governo, e líderes do PT, vêm defendendo a pauta de reforço da política de industrialização.

“Com esse cenário, corremos o risco de que a produção local se desloque a outros centros logísticos e fabris no exterior, como no Paraguai. É impossível competir pagando PIS, Cofins, ICMS e encargos sociais enquanto o concorrente paga ICMS de 17%”.

Diversas redes já operam com unidades fabris em outros países da América do Sul, mas especialmente no Paraguai, por conta de leis de incentivo de produção local.

Na tentativa de buscar caminho de equilibrio de forças, o segmento debate internamente possíveis alíquotas intermediárias do imposto de importação a serem sugeridas ao Ministério da Fazenda na próxima semana, em reunião a ser marcada.

O Valor apurou, entre líderes do varejo, que não há possibilidade de a alíquota ficar abaixo de 35%, mais os 17% de ICMS. A taxa de 35% é uma referência por ser a média de tributação local no vestuário, um dos setores mais afetados pela entrada de produtos importados.

Pelo governo, a medida é vista como uma forma de formalizar operações que vinham crescendo no país em ritmo acelerado, sem controle, com entrada de mercadorias no país de forma fraudada. Ao definir uma nova taxa intermediária, se passa a cobrar algum imposto de vendedores que burlavam as regras na importação.

Rocha viu como “surpreendente” a decisão de isenção e não acha que vai se manter como está — “seria um tiro no pé”.

Ele reforçou que as empresas brasileiras não querem penalizar o consumidor local.

“Nós não queremos penalizar o consumidor, não é nada disso. Queremos um consumo forte no país, que gere emprego e renda. Queremos desonerar a cadeia. O ponto é que, da forma como ficou, com a isenção, ou sem uma taxa que promova a isonomia, não há como competir”, afirmou.

“Cada vez que há um efeito sobre um emprego no varejo, há impacto de cinco empregos considerando toda a cadeia produtiva”.

Rocha ainda lembra que essa mudança nas regras de remessas internacionais acontecem num momento em que se discute uma reforma tributária em que os segmentos mais penalizados serão o varejo, serviços e o agronegócio, diz ele. “Temos dois impactos ao mesmo tempo, da reforma tributária e do desequilíbrio tributário [causado com a portaria do governo]”.

Adriana Mattos, Valor Econômico, 6/7/2023