Varejo defende microimposto de Guedes, desde que desonera folha

Varejo defende microimposto de Guedes, desde que desonera folha

Setor defende aplicação das mesmas regras tributárias na comercialização de produtos e serviços, tanto no mundo físico quanto no digital

Por Adriana Mattos, Valor — São Paulo 31/07/2020

Lideranças do varejo estiveram em reunião na semana passada com o relator da reforma tributária na Câmara dos Deputados, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), para entregar documento com sete premissas básicas defendidas pelo setor. No material, o varejo pede a aplicação das mesmas regras tributárias na comercialização de produtos e serviços, tanto no mundo físico quanto no digital.

Criado pelo IDV, entidade que representa as grandes varejistas do país, o documento defende o que chama de “equidade fiscal entre os agentes econômicos” para reduzir ilegalidade, informalidade e a sonegação fiscal.

O assunto é sensível para as empresas do mercado digital no país, especialmente depois que estados, de forma individual, passaram a elevar impostos sobre o “marketplace” (shopping virtual).

O IDV tem entre seus associados empresas com lojas físicas, venda on-line e marketplace, como Magazine Luiza, B2W e Via Varejo, mas nem todos as empresas digitais são associadas do instituto. Mercado Livre e Amazon Brasil não são membros da entidade.

O Valor informou na edição desta sexta-feira que o presidente Jair Bolsonaro vai apoiar a proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de criar a Contribuição sobre Transações com uma alíquota de 0,2%, ampliando a base de cobrança ao incluir todas as transações digitais no seu escopo.

No material de duas páginas encaminhado ao relator, o IDV defende que a introdução desse microimposto ocorra de modo a compensar a desoneração da folha de pagamentos, que também é um ponto da atual reforma.

Segundo Marcelo Silva, presidente do IDV, compensar a desoneração da folha pela criação de um outro imposto faz sentido desde que não haja um aumento no total da carga tributária sobre o consumo.

“São coisas que precisam vir amarradas, um compensando o outro. Se vier só a cobrança do microimposto, aí é inaceitável. Ninguém aguenta mais pagar mais impostos no país”, diz ele.

Na reforma em debate, o governo quer propor mudanças no IPI (Imposto sobre os Produtos Industrializados), no Imposto de Renda e na folha de pagamentos. A intenção é tributar mais a renda e menos o consumo. Para equalizar isso, o governo defende o novo tributo sobre transações digitais.

A expectativa é que a contribuição arrecade para os cofres públicos cerca de R$120 bilhões ao ano.

Silva afirma que o comércio eletrônico de produtos e serviços precisa da aplicação das mesmas regras e carga tributária no on-line e na loja física, para a “devida equidade fiscal entre os agentes econômicos e para se reduzir ilegalidade, a informalidade e a sonegação fiscal”.

“Não pode existir isso de defender o meu lado primeiro. Se for assim o debate mão anda. Achamos que há um desequilíbrio entre o físico e o digital, o que cria no país um camelódromo digital. E isso precisa ser sanado, mas pela compensação de impostos, sem inventar nova cobrança”, afirma.

“Em última análise, quem paga imposto não é a empresa. A empresa só arrecada,como já disse muito bem o economista Roberto Campos. Quem paga imposto é o povo. A questão é que, no fim, todo esse desequilíbrio fiscal afeta emprego e renda”, diz Silva. “Hoje no Brasil, quem já paga imposto não aguenta pagar mais, e quem não paga, quer continua sem pagar nada. É a lei do meu pirão primeiro”,afirma.

“Nós defendemos que todos paguem, mas paguem menos, por isso e preciso que haja essa compensação, para ter equilíbrio”, diz ele.“No Brasil, o peso dos tributos incidentes sobre o consumo no total da carga tributária é de 47,7%, comparativamente a 32,6% na média da OCDE. Ou seja,cerca de 15 pontos menor, com base nos números de 2016”, diz o instituto no documento enviado ao relator da reforma.

A proposta do governo ainda prevê outro aspecto: a unificação do PIS e do COFINS, criando a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), que terá uma alíquota de 12%. Os sites de venda on-line seriam responsáveis por recolher o CBS quando algum item for vendido pela pessoa física, que não é obrigada a emitir nota fiscal. A primeira fase da proposta de reforma enviada ao Congresso em julho prevê que os “marketplaces”, operações de venda de itens de terceiros na internet, sejam responsáveis pela arrecadação do imposto sobreprodutos vendidos se o vendedor não emitir nota.

“A questão é que se o vendedor não emitir nota, o marketplace é obrigado a tirar esse vendedor do site. E defendemos que isso seja feito, mas é algo que nem todos apoiam”, diz Silva, do IDV.

Antes desse contato com o relator da reforma, o varejo já havia se reunido com o senador Roberto Rocha (PSDB-MA) , presidente da comissão mista da reforma tributária. A atenção agora está voltada para a ida de Paulo Guedes à comissão mista, no dia 4 de agosto, para ver qual será o posicionamento do ministro.

No documento encaminhado pelo IDV ao relator da reforma tributária, o instituto define sete pontos centrais: carga tributária estável, aumentar a base de contribuintes, legislação clara (que evite interpretações e insegurança jurídica), simplificação do sistema de arrecadação, desonerar a folha de pagamento, reavaliar incentivos fiscais que só atendem “grupos de interesse” e a aplicação das mesmas regras tributárias na venda por canais físicos e/ou digitais.

As regras envolvendo a economia digital vem mudando já há algum tempo. Os estados vem tributando o marketplace nos últimos meses, pela criação de leis que regulam a cobrança de ICMS para produtos digitais e também de mercadorias comercializadas no marketplace. O Valor informou em abril que pelo menos quatro Estados editaram leis para responsabilizar os sites pelo não pagamento de ICMS por parte dos lojistas que comercializam produtos em suas plataformas. No Rio de Janeiro, a novidade foi instituída há três meses. Altera pontos da Lei nº 2.657, de 1996. No artigo 18 da lei, o marketplace foi incluído entre os responsáveis por recolher o imposto, caso o vendedor não pague.