Estratégia do governo para estimular pequenos negócios passa por ‘escada de crédito’

Estratégia do governo para estimular pequenos negócios passa por ‘escada de crédito’

A média dos juros para pessoa jurídica está em 18,2%. Quando olhamos para a micro e pequena isso sobe de forma assustadora, para 43% (ao ano) — Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV

Debate on-line da série ‘Caminhos do Brasil’ discutiu o gargalo do financiamento para micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) e apontou como soluções programas de garantia e renegociação de dívidas

Abrir as portas de um negócio, mantê-las abertas e investir para fazer a empresa crescer configuram um desafio e tanto para os pequenos empreendedores. Mas o principal combustível dessa jornada é escasso para micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) brasileiras.

O crédito é hoje um dos principais obstáculos para o desenvolvimento de pequenos negócios, principais responsáveis pela geração de empregos no país.

A solução passa principalmente por instrumentos públicos de garantia, renegociação de dívidas e capacitação de empreendedores. Essas foram as conclusões da live intitulada “O gargalo de crédito para pequenas e médias empresas no Brasil”, realizada na quarta-feira em mais uma edição da série “Caminhos do Brasil”, uma iniciativa dos jornais O GLOBO e Valor Econômico e da Rádio CBN, com patrocínio do Sistema Comércio, através da CNC, do Sesc, do Senac e de suas federações.

A conversa on-line contou com a participação de Guilherme Mello, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda; Jorge Gonçalves Filho, presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV); e Maria Fernanda Coelho, diretora financeira e de Crédito Digital para MPMEs do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A mediação foi dos jornalistas Glauce Cavalcanti, do GLOBO, e Álvaro Campos, do Valor. Você pode ver o vídeo com a live completa no link:

Na comparação com outros países emergentes, o Brasil tem um dos maiores gargalos de financiamento a MPMEs do mundo. Mesmo quando os empreendedores por trás desses negócios conseguem saltar a barreira inicial das instituições financeiras, não encontram linhas de financiamento com taxas de juros que caibam em suas planilhas.

A inadimplência entre as MPMEs é bem mais elevada que a das grandes empresas, levando os bancos a cobrar juros maiores pelo alto risco. Um problema alimenta o outro.

Participantes do Caminhos do Brasil. Foto: Reprodução

Os participantes da ‘live’ sobre crédito para MPMEs da série “Caminhos do Brasil”: Guilherme Mello, Jorge Gonçalves, Maria Fernanda Coelho e os mediadores Glauce Cavalcanti e Álvaro Campos — Foto: Reprodução

Durante o debate, o secretário Guilherme Mello afirmou que o governo federal está atento à questão porque reconhece a importância das MPMEs na geração de emprego e renda. Para eliminar o gargalo, a estratégia do governo é estruturar o que ele chamou de “escada de crédito”, com condições específicas para cada tamanho e característica de negócio dentro desse universo, do microempreendimento à indústria de médio porte.

Soluções diferenciadas

Mello destacou o consenso no diagnóstico de que o custo do crédito, a falta de garantias e a maior inadimplência das MPMEs estão entre os principais obstáculos para melhorar as condições de crédito para elas no mercado financeiro.

— A solução que temos encontrado nos últimos anos, que tem sido bem-sucedida e que agora vai ser aprimorada, é a oferta de garantia pública para viabilizar a tomada desse crédito — disse. — Cada público vai ter uma linha de crédito com garantias e condições adequadas ao seu nível de desenvolvimento empresarial.

O secretário também citou a frente voltada para a renegociação de dívidas, uma forma de limpar o CNPJ de inadimplentes e reabilitá-los para o crédito. Ele afirmou que o programa Desenrola Pequenos Negócios, voltado para pessoas jurídicas, já renegociou R$ 2,5 bilhões em um mês de operação e que o volume total pode chegar a algo entre R$ 7 bilhões e R$ 10 bilhões.

Na ponta, juro supera muito a Selic

O presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), Jorge Gonçalves Filho, apresentou a perspectiva dos pequenos empresários, boa parte deles no comércio. Ele afirmou que o país tem uma oportunidade de aumentar a participação das MPMEs no crédito. Segundo ele, as microempresas representam hoje cerca de 5% do crédito a pessoas jurídicas, as pequenas, 17%, e as médias, 28%. Ou seja, metade fica com as grandes.

Dados do SME Finance Forum mostram que a diferença entre a demanda desses negócios por crédito e o que é ofertado no país equivale a 27% do Produto Interno Bruto (PIB), bem acima do patamar de pares internacionais. Na China, esse gap é de 17,4%. Na Argentina e no Chile são 14,7% e 3,5%, respectivamente.

A inadimplência de MPMEs é muito elevada. Segundo dados do Banco Central do Brasil (BC), o índice de atrasos do segmento em maio estava em 4,6%, ante 0,5% nas grandes empresas. Isso tem impacto também sobre as taxas de juros, frisou o presidente do IDV.

 

Presidente do IDV, Jorge Gonçalves Filho

— A média dos juros para pessoa jurídica está em 18,2%. Quando olhamos para a micro e pequena isso sobe de forma assustadora, para 43% (ao ano) — afirmou Gonçalves.

Diante da constatação de que o juro na ponta para o empreendedor pode superar em muitas vezes a taxa básica (Selic), hoje em 10,5% ao ano, Guilherme Mello afirmou que a retomada do ciclo de cortes dos juros pelo BC é importante para reduzir os custos de crédito para firmas. Ele destacou a desaceleração do IPCA em junho como um sinal de que o índice converge para a meta anual de inflação, de 3%, abrindo espaço para novos cortes na Selic “em breve”.

— Há um cenário propício para que em breve, talvez no começo do próximo ano, retomemos um caminho de redução sustentada da taxa de juros — afirmou. — Claro, há turbulências internacionais, mas também já há sinais de que o banco central americano, a partir de setembro, vai começar a reduzir a taxa de juros.

Diferentes degraus

Um instrumento essencial do governo na oferta de soluções de crédito para MPMEs, o BNDES adotou esse segmento como uma de suas prioridades estratégicas, afirmou Maria Fernanda Coelho. O BNDES é responsável pela operacionalização do Programa Emergencial de Acesso a Crédito (FGI-PEAC), um dos componentes da “escada de crédito” citada por Mello. O programa vai de microempreendedores individuais a médias empresas.

Nos primeiros degraus dessa escada, no entanto, há iniciativas do governo mais focadas em empresas menores, ou seja, com mais dificuldade de acesso a crédito. Uma delas é o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), criado para socorrer pequenas empresas na pandemia e que se tornou permanente após ajustes.

Neste ano, o governo lançou também o Acredita Primeiro Passo, de microcrédito produtivo para pessoas inscritas no Cadastro Único, e o Procred 360, focado em MEIs e microempresas.

No debate, Maria Fernanda compartilhou do diagnóstico dos outros participantes do debate e acrescentou que, como reflexo do crédito limitado, muitos pequenos empreendedores acabam recorrendo a linhas de crédito mais caras, até mesmo na pessoa física, como o cartão de crédito ou o cheque especial, e entram numa escalada de inadimplência. Ex-presidente da Caixa, ela destacou o avanço de iniciativas como o Desenrola para reconduzir essas firmas ao sistema financeiro.

Mercado de capitais

A diretora afirmou que a estratégia do BNDES para ampliar o acesso das MPMEs ao seu crédito se baseia no fortalecimento da capilaridade de sua rede de instituições parceiras e dos sistemas de garantia e no crédito digital, que automatiza e agiliza os processos.

Outra frente de atuação do BNDES, disse Maria Fernanda, é o fomento ao acesso de empresas de menor porte ao mercado de capitais:

— Isso pode beneficiar cooperativas de produção e médias empresas especialmente. E também aquelas pequenas que já têm um patamar de governança e de dados mais elevado.

Para José Roberto Tadros, presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, é importante que as MPMEs contem com um ambiente de negócios que as estimule a crescer:

— São elas que geram a maior parte dos empregos e da renda, fatores fundamentais para movimentar a economia. O Brasil só tem a ganhar com políticas de crédito bem aplicadas, com foco nas necessidades e nas condições específicas desses empreendimentos.

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