Confira o artigo de Marcos Gouvêa de Souza, conselheiro do IDV, publicado no portal Mercado & Consumo
Vamos começar definindo que “birutice” é derivado do comportamento errático e imprevisível da biruta, aquele recurso usado para indicar direção e intensidade do vento como precário elemento auxiliar para pouso e decolagem de aeronaves.
Em inglês, a biruta é “windsock” de forma mais direta, mas a nossa biruta tem sentido figurado de mostrar exatamente as mudanças repentinas de ideias que caracterizam esse comportamento errático e imprevisível
No cenário atual, “birutar”, gerando “birutices”, tem sentido equivalente a “trampear”, trazendo para o português um novo sentido para o verbo em inglês “to trump”.
No contexto até então, “to trump” significava vencer ou superar algo ou alguém apresentando algo melhor, mais forte ou mais convincente.
No contexto revisitado pela realidade, “to trump” deverá significar tentar vencer ou superar alguém agindo de forma imprevisível, lançando e “deslançando” políticas e ações nas mais diversas áreas.
E, no campo das taxações no comércio internacional, gerando forte impacto no cenário interno do próprio país e com importantes reflexos globais.
“I am trumping”, em sentido figurado e revisitado, poderá significar que, para ganhar, estou fazendo o que me dá na cabeça e anunciando para o mundo com todas as suas consequências e baseado no sentimento de que sou, quero e posso fazer o que bem entender.
De outro lado e de forma absolutamente racional e quantificável, é importante lembrar que as nossas relações comerciais com EUA e China, os maiores protagonistas dessa guerra de taxações, têm dimensões bem distintas para o Brasil.
Em 2024, o saldo da balança comercial com EUA foi negativo em US$ 283,4 milhões e com China foi positivo em US$ 30,7 bilhões.
No primeiro trimestre deste ano de 2025, o saldo da balança comercial com EUA foi negativo em US$ 653,1 milhões e com a China positivo em US$ 744,6 milhões.
Se considerarmos o período acumulado de 2021 a 2023, o saldo da balança comercial com EUA foi negativo em US$ 23,1 bilhões e com a China foi positivo em US$ 120,4 bilhões.
O que por si só justifica muita cautela e visão estratégica na análise dos cenários de curto, médio e longo prazo.
Mas o que já se tem configurado, sujeito a idas, vindas e reconfigurações, permite estimar potenciais consequências no varejo local.
Vamos às 10 mais perceptíveis até o momento. Mas, parafraseando o slogan, “em 20 minutos, tudo pode mudar”.
Para fechar e refletir de forma mais abrangente
Todo esse cenário global de taxações, com suas ações e reações em momento e dimensões ainda indefinidos, está diretamente focado na proteção dos setores industriais, em especial dos Estados Unidos e China, mas envolvendo as principais economias do mundo.
No Brasil, também foram sinalizadas ações protetivas para o setor industrial que ficaram confirmadas na recém-aprovada reforma tributária.
Ocorre que, quanto mais se desenvolvem as economias e de forma irreversível, maior é a participação dos setores de serviços no PIB desses países.
No conjunto dos cinco mais desenvolvidos do mundo, esse percentual se aproxima dos 80%, com exceção da China, e no Brasil já estamos no patamar de 70% – apesar da força e representatividade crescente do setor agrícola.
Nos próximos dias, semanas e meses vamos continuar assistindo a esse novo capítulo da história econômica do mundo sendo reescrito de forma como o bom senso definitivamente não recomendaria.
Momento fundamental para repensar os fundamentos, práticas e conceitos dos negócios em que estamos envolvidos.
Para considerar
Vale assistir ao filme biográfico “O aprendiz” lançado no ano passado e disponível na Amazon Prime e Apple TV e que mostra a ascensão de Donald Trump no mercado imobiliário de Nova York.
Como não foi contestado, supõem-se que é bem fiel à história romanceada do atual presidente norte-americano.
Explica muita coisa do que temos acompanhado.
Marcos Gouvêa de Souza, conselheiro do IDV, é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma MERCADO&CONSUMO.
Imagem gerada por IA