Em lados opostos, ‘Bets’ e varejo protagonizam a nova disputa por renda no país
Nos últimos meses, o varejo tem acompanhado com atenção o avanço de sites e aplicativos de apostas esportivas, conhecidos como “bets”. Esse fenômeno levanta preocupações no setor, especialmente porque, para varejistas e empresas de serviço, parte desses gastos está sendo desviado da renda familiar, impactando diretamente o orçamento da população, registra reportagem do VALOR.
A questão é que há percepções diferentes entre as empresas do setor de apostas e as companhias de varejo e serviços em relação aos efeitos do avanço dos jogos on-line no Brasil.
As “bets” acreditam que as redes de varejo crescem abaixo de seu potencial hoje por questões internas, de gestão, e não, especificamente, pelo crescimento dos jogos esportivos digitais.
Na ponta oposta, o entendimento das plataformas é outro.
Frederico Trajano, presidente do Magazine Luiza, disse em um evento, semanas atrás, que as “bets” são um fenômeno novo e que podem ter um impacto no consumo no longo prazo.
Já as redes Assaí e Atacadão entendem que há efeito no setor neste momento, e distribuíram, nos últimos meses, comunicados internos a funcionários alertando para as “armadilhas” dos gastos desenfreados nas plataformas.
Estudo do Instituto Locomotiva revelaram que as classes de renda mais baixa (C, D e E) são as mais afetadas por essa tendência. Além disso, outros levantamentos de consultorias, feitos com consumidores, mostram aumento no comprometimento da renda que iria para aluguel e compra de alimentos com as apostas.
Em serviços, empresas de telefonia relatam dificuldades para ampliar a receita com clientes de planos pré-pagos, que precisam fazer recargas periódicas. As “bets” e essas empresas disputam a renda semanal do trabalhador, que autônomos e pessoas que vivem de “bicos” recebem.
“A ‘bet’ é o principal competidor nesse momento. Não sei o quanto isso será danoso no longo prazo. São pessoas de baixa renda, com dificuldade de manter suas necessidades básicas, apostando de maneira muito simples”, afirmou o presidente da Claro, Paulo César Teixeira, em evento, em junho, segundo o site “Infomoney”.
Trata-se de uma indústria que movimentou no país entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões em 2023, e que pode alcançar até R$ 130 bilhões em 2024, aponta um levantamento da Strategy&, consultoria estratégica da PwC.
No entendimento das plataformas, porém, há um exagero nas análises das empresas de consumo e serviços. “Na nossa visão, há um gasto sendo feito, mas muito menor do que essas redes falam, e as pesquisas têm metodologias questionáveis”, diz um executivo de uma grande empresa de apostas.
“Além disso, vamos combinar que o varejo está buscando um ‘bode expiatório’ para as dificuldades que algumas redes têm de melhorar os seus resultados. Antes, o problema das varejistas eram os marketplaces asiáticos, como Shopee e Shein, e agora são as bets”, diz um diretor de uma empresas de jogos on-line. Para essa fonte, segundo cálculos internos, faz mais sentido os números do recente estudo do Itaú publicado sobre o tema.
Segundo o relatório da equipe de análise do Itaú, publicado em agosto, cerca de R$ 24 bilhões líquidos foram destinados aos jogos on-line de cassino e apostas esportivas no Brasil em 12 meses, até junho de 2024. Esse dado seria mais crível, na visão das plataformas, porque desconta os prêmios pagos pelas empresas aos usuários
Em julho, uma portaria da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda passou a exigir que as plataformas de apostas estabelecidas no Brasil identifiquem e classifiquem os riscos dos apostadores, além de comunicar transações suspeitas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
As regras começam a valer em 1º de janeiro de 2025, quando entra em vigor o mercado regulado de apostas no país.
No entanto, a medida não foi avaliada como suficiente por representantes do setor. A Abras, associação de supermercados, e o IDV, maior instituto do setor, com 70 redes associadas, estão discutindo em reuniões internas o impacto no setor e os efeitos em cada segmento.
O comando da Abras disse que varejistas analisam debater junto ao Congresso Nacional normas mais rígidas envolvendo a regulação, por meio de portarias, da lei das apostas esportivas on-line. Pelo menos, dez portarias já foram publicadas sobre o tema após a regulamentação da lei neste ano, diz um executivo do setor de “bets”.
Há expectativa de que o projeto de lei que define novas regras para os jogos de azar e apostas no país seja votado pelo Senado até setembro deste ano.
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